quarta-feira, 22 de julho de 2015

A Besta Notívaga

Você sorri e eu
sonho sonhos de neon e com sons de tamborim
eu acordei três da madrugada de ontem
pra saber se você ia ligar, mandar um sms
para me cantar, sórdida de amor

Caminhei, parecia blues quando eu passava
pela Nove de Julho e mendigos gritavam
pra ninguém ouvir
um desespero na garganta, apedrejamento social
está nos outdoors de mais um político
jurando fazer justiça a um povo prático
enquanto eu te esperava, sórdido de amor

No centro eu um, o fininho é dez
e eu não figuro meus sentidos mas
misturo pernambucanas e jequití
e eu não ligo mais pra quem passa e não me vê
como o hipster das redes sociais
me canso fácil
tomo pinga pra valer, o que é legal é saber
não sou fã desses uisques e destilados importados
o meu chaveiro é do porto de galinhas e
ainda nem fui lá
pra que iria?

Como de noite, sou a besta notívaga
canibal, em busca de leite e sangue
numa mistura doida e doída
Deus até fecha os olhos quando estou de partida
e fecho o bar, voltam pro lar
e eu aqui, nessa pose de otário
falando com caretas sobre a maioridade penal
e outras hipocrisias que só se aprecia
nas universidades

eu sou o tal, eu sou o boy, e eu não tenho refrão
nem atenção, nem solução, tesão, filão, masturbação
é a moda de outras bestas por aí, na próxima estação
eu sei que então, teremos (paz), e você nunca me ligou
mas tudo bem, eu sei que você um dia vai sair desse mundinho
tão insípido e insosso quanto a porra espalhada nos lençóis
paredes podres e mofadas
eu sou uma serpente em uma estrada
numa tarde de 35 graus.

dinheiro e paz, eu quero mais que vá tomar no cu
quem inventou essa porra de paz
sou rapaz feito, de madrugada e cal
a preferência é pagar mais e o prazer é anormal
não se esqueça que eu disse que sou canibal
eu sou a besta notívaga
eu sou a besta notívaga
eu sou a besta notívaga

eu sou a besta notívaga.

quinta-feira, 28 de maio de 2015

O Coração Tardio

Oi, parabéns. Soube que a sua vida está indo muito bem.
Pensei em te chamar antes, mas leva um tempo
pra fugir dos clichês,
pra ser sincero e soar convicto.

Eu devia ter te chamado pra sair
e tomar aquele uísque que sempre combinamos.
Ouvir uma banda legal, ao vivo.
Te pedir um beijo pra guardar pra mim.

Depois das nossas conversas achei que devia ter feito isso.
Nada forçado mas bem ensaiado e orgânico
porque eu acho que rolava essa "tensão" vez ou outra.
As vezes era o seu olhar. As vezes era minha imaginação.

Eu sei que pode ser nada!
Nunca fui bom em captar estes sinais misteriosos...
É que eu me perco frequentemente tentando focá-los
entre a linha do horizonte e a dos seus lábios

Queria te dizer isso pessoalmente.
Mergulhar nos seus olhos pra saber a sua reação.
Será que você desviaria o olhar? Ficaria vermelha e sorriria,
sem graça, dizendo algo que soa abafado de ansiedade?

Agora não dá mais. Temos outros amores
Cuidamos deles, e eles cuidam de nós.
Existe paixão, e o sonho duradouro. Eu nunca negaria...
Mas ainda assim precisava confessar

Eu tinha que trazer tudo à tona
porque eu não consigo me desprender.
A noite vem e com ela o meu delírio
A ideia louca de que, dito tudo, um "eu quero" é mais que provável

Me desculpa se me enganei, ou se soou como engodo
Talvez a minha mente seja realmente um labirinto
sem saída e sem prêmios. Ando obcecado por aí
Talvez lá eu apenas sonhasse e era você o tempo todo.

sexta-feira, 17 de abril de 2015

O Obscuro Pós-moderno (homem hipócrita pós-moderno)

Eu sou uma projeção de um pseudo intelectual, superior, ainda assim, à todos que conheço
eu uso gola polo listrada e não sei combinar com calças ou bermudas
a moda nunca algo atraente
nem modelos

gosto de pescoços, não de sorrisos
não sou vampiro, só fui before it was cool
gosto de saliva, de beijos e toque suave de seda
gosto de compactos e não de sedans

gosto de maconha e abomino cigarros
mas fumo mais cigarro que maconha pois não tenho contatos
tem uma menina linda que não olha pra mim
tem um travesti me olhando e pensando porque eu não chego logo nele

eu bebo bebidas baratas e caras se as baratas estiverem na moda
não gosto de emos, hipsters, punks, metaleiros, nazistas, corintianos, crentes, asiáticos, cariocas, paulistas e sulistas e nordestinos e capricornianos e todo o povo latino.
até que eu pare um momento pra pensar

eu uso óculos, não tenho dinheiro, mas uso óculos
pago de santo e conservador, desejando um face sitting e um gang bang
leio livros que ninguém lê
vou aos shows em que o povo não está nem aí
eu sempre chego atrasado, nas escolas e nas festas
fico calado por vergonha de sorrir


quarta-feira, 25 de março de 2015

Molduras

Eu não sinto como se quisesse fazer alguma coisa hoje.
As vezes acho que sou um fantasma
e que os raios de sol me atravessam toda tarde.
As vezes acho que sou a trilha sonora triste
no epílogo de um filme singelo e bonito,
ou uma folha seca que o vento carregou pra muito longe.
Me sinto assim quando trabalho
e quando chego em casa no fim do dia.
Quando não tenho nada pra fazer o dia todo,
bem como quando preciso lavar a louça.
As unhas crescem, os pelos crescem,
mas continuo apenas uma fração do infinito.
Ou um buraco negro, sugando a luz que carrega a vida.

Ao menos eu sei que as vezes isso passa.
E eu vejo as outras pessoas,
acho que posso ser bom e gentil
para que eles não se sintam assim.
Eu penso que não tenho cor,
ou se tenho, só tenho uma.
Num mundo tão colorido, cheio de tons,
nada vivo me interessa,
não sou tão fã assim dessas molduras

quarta-feira, 18 de março de 2015

Devolução

Se não me amares mais
devolve a minha liberdade
meus lápis de cor
devolve a minha geladeira
também a televisão velha

Se não me amares mais
devolve os cds do Chico
devolve o meu travesseiro
devolve os meus amigos
os velhos e bons, que eram só meus

Se não me amares mais
me devolva, faça o favor
o amargor do meu álcool
o tabaco dos meus dentes e
a fumaça dos meus pulmões

Devolve o meu cheiro
devolve a esperança
o meu medo da morte
devolve todo o tempo que me tomou
me devolve a vida como antes

E vai, pois, se como diz
não te dei nada
então não há nada
aqui entre nós
de que você sentirá falta

segunda-feira, 16 de março de 2015

Hipérboles (ou Todos os Clichês do Mundo)

Venha comigo! Confie em mim, porque
quando estamos juntos, meu
coração em teu peito explode!
Mil pedaços que se espalham no
chão! Tal qual sementes tardias e
tornam-se flores e florestas e
te cobrem de adornos!

E do teu perfume evaporam-se beijos,
abelhas que te polinizam,
borboletas e rouxinois e bem-te-vis!
(eu nunca vi os rouxinois!)

E te fazem cantar com eles, e
tiram o mel dos teus olhos, da
sua boca! E de tanto admirar-te,
transpiro! E do meu suór se faz chuva,
uma chuva que vira mar e do meu sal
se faz um coral que te cerca e te venera!

É onde você repousa pura e eterna
intocada, como o mais soberano e
oculto diamante, dentro
de um aquário na minha sala
repousando perto da janela banhada
por uma suave brisa e raios de sol!

Assim ecoa pelo universo, através
de toda a via láctea, num espectro de luz!
Dos sonhos gregos, apolíneos e dionisíacos e
dos mais suaves vinhos e fervorosas paixões!
Da paz em uma xícara de café, de tardes
tediosas de outono! Eu te suplico!
Vem comigo! Confia em mim!


quinta-feira, 8 de janeiro de 2015

Soneto de Paixão e Suicídio

Por entre curvas e estradas retas,
no fundo do meu peito fui encontrar.
Através das artérias, em que corre, das veias,
meu insípido sangue se transforma em mar.

Nas noites sombrias e sem estrelas,
fui assistir valente ao sol que nascia.
Vesti minhas formas, segui seus passos,
chorei surdo num sonho que inebria.

Vi lá, você, distante de pura beleza.
Vi algo mais, uma forma retorcida se fosse.
Mas era eu, alto e esfomeado, um reflexo.
Pro mar voltava pois o mar me trouxe.

Matei minha sede tão tarde
que não vi da clareira você sair
porcontemplar tua sombra que à luz arde.

Lembrei de outros dias, outro coração que se parte,
quando você sorria e me inspirava a sorrir
e fazia do amor tempestades, sua verdadeira arte.

quinta-feira, 25 de dezembro de 2014

O Bom Praticante do Amor

Vai ao mais profundo que o amor pode chegar
e à felação, com sorte.
Sai à noite, não à caça. Pergunte a diferença:
ele ri.
De si mesmo e dos outros, claro
porque de noite é a hora do pai.

Lê nas mãos das delicadas jovens
pétalas de rosa e tempos de maravilhas
carmesim como seus rostos, ao suspirar
é o sabor de seus corpos espalhados no leito

Se ressentem fácil, então por que exigir tanto
conversa fiada é a sinceridade dos precipitados
que importa política, hoje e amanhã?
O que importa é o sussurro suave

Ou assim ele diz

E elas se incendeiam, quando ele passa
é o que ele diz pois,
afinal, como bom praticante do amor
tem que ter feeling e gel no cabelo
agora lá vai.
É a hora do pai

quarta-feira, 24 de setembro de 2014

tão delicado é o sentido da vida

Você ensaia as palavras da próxima entrevista de emprego
não cometerá os mesmos erros
o problema é nunca saber quais erros são
e de repente, a própria concepção do erro
transborda em indiferença, nos corredores apertados e suados
da próxima entrevista de emprego

Você olha bem de perto, no espelho
pra dentro do buraco negro dos teus olhos
profundos e profanamente vazios
se lembra que esqueceu de tomar os comprimidos
esqueceu a razão de tomá-los todas as manhãs
todas as noites
quando as manhãs viram noite
e bolhas de sabão flutuam sob seus olhos semicerrados

Você faz desenhos
nas paredes, nos travesseiros e lençóis
gosta de usar tons carmesins
você os chama de carmesins porque se sente blasé
se sente diferente. Você queria ter uma identidade
você queria exaltar seu novo penteado e seus óculos
cujas armações são feitas de madeira de reflorestamento
você ajuda o mundo cada vez que respira enquanto desenha
com uma faca nos braços

Já eu
eu cuido das flores
sigo seus tons, contrastes com os tons pastéis da minha vida
sigo o fluxo do vento por entre flores que não são minhas
eu invado jardins
tão delicado é o sentido da vida
que eu não quero estar por perto quando ela me chamar de volta

segunda-feira, 28 de julho de 2014

Pequenas Paixões Gratuitas

Eu vivo de pequenas paixões, de olhares sublimados pelo vento, de fios de cabelo que cruzam o rosto dançando conforme andam selvagens e sutis de encontro à pele e de encontro ao vazio. Gosto desses pequenos amores que vêm com o amanhecer e se eclipsam já num pensamento distante de uma quinta feira nublada.

Quero dois sóis pra contemplar: um é o meu, único e óbvio, embora não seja isso imperfeição.
E o outro, que nunca terei, mas que sempre adorarei. Mutável em suas formas e cores, eu o desejarei de forma intimista durante alguns dias, e nos outros com desespero e aflição. Mas nunca poderei tê-lo, pra não perder os dois.

Pois não acredito em um pouco de sorte. Ou você tem tudo o que merece e deseja algo, ou você não tem nada e passa a viver arrependido do que perdeu.

Mas eu me apaixono com facilidade por sorrisos e trejeitos, por conversas tonais e descontraídas.
Vejo-as passando e imagino: para onde voarão hoje? De onde vieram e se tem saudade.
Eu adoro as infelizes. Não tenho dó, não sinto pena das infelizes, eu só as adoro.

Porque projeto em mim uma salvação secreta. Um conforto que só as infelizes mais sortudas são capazes de encontrar. Eu sou um Deus bondoso e cheio de amor, com braços abertos e um enorme e caloroso sorriso. Sereno e paciencioso, eu observo o modo como caminham, pensando na textura de sua pele. Pensando no formato dos seus lábios, os mais simétricos.

Mas sou invisível.

Porque são paixões findas essas minhas pequenas paixões. Não são reais e morrem como estrelas que brilham forte, mas estão tão longe que só percebemos seu poder quando partiram.

São minhas, tão minhas que fantasio. São tão minhas que às vezes proíbo a mim mesmo de pensar. São minhas paixões, pequenas e tímidas. E se quebram a cada esquina e eu espero que voltem, que se virem e vejam o que sou e o que quero, como transbordo essa densidade, como me reprimo para continuar preso naquele momento...


Aquele pequeno momento em que somos felizes.