quarta-feira, 18 de março de 2015

Devolução

Se não me amares mais
devolve a minha liberdade
meus lápis de cor
devolve a minha geladeira
também a televisão velha

Se não me amares mais
devolve os cds do Chico
devolve o meu travesseiro
devolve os meus amigos
os velhos e bons, que eram só meus

Se não me amares mais
me devolva, faça o favor
o amargor do meu álcool
o tabaco dos meus dentes e
a fumaça dos meus pulmões

Devolve o meu cheiro
devolve a esperança
o meu medo da morte
devolve todo o tempo que me tomou
me devolve a vida como antes

E vai, pois, se como diz
não te dei nada
então não há nada
aqui entre nós
de que você sentirá falta

Um comentário:

Felipeta disse...

Cara...

Não sei se é proposital, mas este texto parece o desfecho do poema abaixo, em que a paixão hiperbólica sentida se desfaz após atingir se zênite, culminando em um desfecho melancólico e sólito que resume quase todas as nossas relações amorosas.

Entramos em êxtase por encontrar a paixão em sua forma mais perfeita e sublime, mesmo que imperfeita aos olhos de outrem, e a vivemos com toda a intensidade.
Mas, quando essa energia se esvai, fica o que sempre esteve ao seu lado, da companhia do cigarro até a miséria física, material e existencial que possivelmente sempre esteve ao seu lado, mas que por causa do amor, ela não era mais percebida, voltando a tornar-se hoje, um velho companheiro que há anos não dava as caras (acontece... De diferentes modos e intensidades, todos vivemos um pouco na miséria e na riqueza. Isso é ser humano).

Como disse Neil Young um dia:
"melhor queimar de vez do que se apagar aos poucos." Isso, meu caro, pode explicar o que é a ida do amor. Sobra-se, no começo, as cinzas, que irão alimentar o solo de um campo que voltará a crescer.