Aah, se ela soubesse!
E me guardasse um beijinho solene na bochecha, faria de mim o homem mais feliz, ao estar a seu lado, e sentir seus dedos entre os meus. Queria rir sem graça quando tropeçassemos juntos na calçada. Queria ser o homem dela, e queria que ela soubesse disso e quisesse ser minha mulher.
Acontece que parti, e se ela soubesse como me faz falta abrir a janela de cima da casa e vê-la dançando no jardim, no meio das rosas e das margaridas, procurando as borboletas, enquanto eu, distante e inóspito, observava tudo ao seu redor, ao invés de estudar para entrar na faculdade.
Na hora do almoço, a mãe chamava e eu, por mais que corresse, sempre ficava para trás, enquanto ela, linda como uma bailarina, adentrava a sala e cantarolava. Ela enrolava os cabelos com o indicador, e quando a mãe chamava sua atenção, ela corava, olhava para mim através da mãe e ria, como se eu compartilhasse dos seus trejeitos.
Sua mãe não aguentou o parto, e seu pai ela nunca viu. Veio viver conosco, eu e minha mãe. Mas nunca a vi como irmã, Deus sabe! Eu era garoto, um garoto gordinho, um garoto isolado e tímido, e a mãe não gostava que rissem de mim.
Quando a guerra veio, ela era uma moça de pernas suaves e lindas, cabelos encaracolados e negros, e tinha um perfume suave e inigualável. Eu tive de me alistar, pelo nome de minha família. Faz quase dois anos que não retorno ao lar, e a guerra continua implacável e incoerente. Como ela está? Como está a mãe?
Aah, se eu soubesse....
Um comentário:
Muito bom o texto, muito gostoso de ler, ainda mais porque acho que me encaixo nele, .. perfeitamente até .. e digo mais: 'aah, se ele soubesse ...' ;)
parabéns :)
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